Tire os monstros para dançar - Viagem Literária

Tire os monstros para dançar

Monique Malcher não tem medo de cutucar seus monstros e a literatura foi uma forma de colocar todos eles para correr. Agora utiliza as fragilidades da vida pessoal como mote de suas oficinas de escrita criativa, como a “Monstruosidades e fraturas na infância”, ministrada pelo programa Viagem Literária nas bibliotecas das cidades de Barretos, Paraíso, Jaboticabal e Ribeirão Preto, de 17 a 20 de outubro.

 

Os encontros proporcionaram aos participantes verdadeiros momentos de reflexão. “Eu já falei bastante sobre a monstruosidade em si, mas como gosto de escrever histórias com personagens infantis, achei legal juntar os dois temas e trazer para discussão as fraturas afetivas dessa fase”, comenta Monique. Para ajudar no processo criativo, a escritora usou como referência obras de mulheres latino-americanas, como as crônicas Como eu gostaria de ter perdido um olho, de Paloma Franca Amorim e o Rinha de Galos, de Maria Fernanda Ampuero, além de Flor de gume, da própria autora, vencedor do Prêmio Jabuti de 2021, na categoria contos.

 

Apaixonada por entender a mente e o comportamento humano, Monique acredita que a infância é um momento repleto de questionamentos sobre a vida adulta. “Só que quando chega a vida adulta é lá na infância que buscamos as nossas perdas, os nossos caos. Me incomoda muito que esses personagens violentos que a gente constrói nessa fase sejam nomeados como monstros.  Será que a monstruosidade não está naquele corpo que a sociedade quer que se adeque? São questões como essa que foram debatidas ao longo das oficinas”, finaliza a escritora.

 

Monique Malcher é escritora e ganhadora do Prêmio Jabuti 2021 na categoria Contos. É também artista plástica, antropóloga e doutoranda com pesquisa voltada ao gênero, literatura e quadrinhos.

 

 

 

Blog

Fique por dentro de tudo o que acontece nos três módulos do Viagem Literária!

Mari Bigio: a voz feminina do cordel aterrissa em terras paulistas diretamente do Nordeste

Mari Bigio: a voz feminina do cordel aterrissa em terras paulistas diretamente do Nordeste

A jornada de Mari Bigio no Viagem Literária 2024 foi longa. De 20 a 30 de agosto, a pernambucana de Recife que se tornou escritora, cordelista, contadora de histórias, compositora, cantora e radialista, percorreu nada menos do que oito municípios paulistas – de Pinhalzinho a Itatiba e Caieiras, passando por São Paulo, na Biblioteca Parque Villa-Lobos, seguindo para Pardinho, Itapetininga, Tatuí e Itu -, levando a literatura de cordel para um público sempre (e prá lá) de receptivo. “Me sinto honrada, como nordestina, em poder participar do programa deste ano, que coloca a voz do cordel em evidência, um patrimônio cultural nacional”, destacou Mari. Para Mari, a arte precisa viajar para todos os lugares.  “Foi uma oportunidade única poder circular por aqui e apresentar minha obra autoral – de uma mulher, nordestina, cordelista, mãe e negra - tanto na capital paulista como em bibliotecas pequenas das cidades do interior”, comenta a contadora de histórias, elogiando o empenho das bibliotecas em receber o projeto e enaltecendo o viés da proposta do SisEB (Sistema Estadual de Bibliotecas Públicas de São Paulo), que visa espalhar a literatura por todos os cantos, valorizando autores e narradores. De Recife para São Paulo Em São Paulo, Mari Bagio comandou duas sessões de “Contação de Histórias - Literatura de Cordel” na oca da Biblioteca Parque Villa-Lobos, reunindo 88 crianças e adolescentes, entre 8 e 15 anos, acompanhadas de 10 professores, que vieram de três escolas públicas (CCA São Paulo da Cruz, EMEF Prof Luiz David Sobrinho e CEU EMEF César Arruda Castanho). “Percebi que os professores se sentem muito satisfeitos em poder proporcionar momentos tão especiais aos seus alunos”, observou Mari.Com 17 anos de carreira, tendo recebido diversos prêmios ao longo dessa trajetória, possui dezenas de cordéis e 17 livros infantis publicados, além de álbuns musicais e canções disponíveis para escuta nas principais plataformas digitais. No seu canal no YouTube é possível encontrar algumas de suas histórias, nas quais mistura cordel, música, sonoplastia, teatro de bonecos, mamulengos, fantoches e outros recursos cênicos.Imagem: Mari Bagio durante sessão na Biblioteca Parque Villa-Lobos (23 de ago. SP) Foto: equipe SP Leituras.   
Literatura de Cordel atravessa o século XXI

Literatura de Cordel atravessa o século XXI

A literatura de Cordel no Brasil, também conhecida como folheto, literatura popular em verso, ou simplesmente cordel, no início, estava ligada aos grupos sociais mais pobres do Nordeste – ou “marginalizados. Com suas raízes na oralidade, mais intensamente nas últimas décadas do século XX, essa literatura deixou de ficar restrita às camadas populares; ao contrário, pessoas com formação escolar e intelectuais passaram a compor cordéis. Muitas das antigas histórias continuam sendo reeditadas até hoje. Na modernidade, esta tradição literária continua viva ganhando novos contornos pelas vozes de autoras e autores contemporâneos. Nesta 16ª edição do Viagem Literária, a Cia. Pé do Ouvido, criada em 2013, trouxe para o público de quatro bibliotecas públicas municipais das cidades de Ubarana, Tabapuã, Monte Aprazível e Colina, no interior paulista, entre os dias 20 e 23 de agosto de 2024, um repertório de narrativas e canções que celebram os pássaros e o desejo humano de voar. Mas com um novo ingrediente: todas as histórias são cordéis, escritos por autoras e autores contemporâneos, como Cristiano Gouveia, Sandra Lane, Cascão e Carolina Resende. Cada texto traz um tema, um estilo próprio de versejar, mas uma coisa em comum: as aves são as personagens principais em todos eles.As apresentações da contadora de histórias, Lilia Nemes e do violonista e cantor, Daniel Conti, deixaram as narrações bem musicais, divertidas e poéticas. “Entre uma história e outra, cantamos músicas tradicionais sobre os passarinhos e outras aves e sobre o nosso desejo - muito humano -  de voar”, comenta  a dupla. De geração em geração Para a Cia. Pé do Ouvido, a literatura de cordel é uma manifestação cultural popular, ligada à oralidade, à improvisação, à palavra cantada e aos contextos de festa, de feira, praça e diversão. “É um desafio é também um grande benefício para esses espaços, uma forma de arejá-los com a riqueza e a força dessa cultura nordestina que, por muito tempo, foi considerada, de forma preconceituosa, como "inferior" ou "menor" em relação à cultura escrita dos homens brancos letrados”, comenta Lilia Nemes.Ela acredita que a literatura de cordel tem um papel fundamental na divulgação das tradições culturais brasileiras, tanto pelos temas que os folhetos comunicam, quanto pelas características formais da linguagem, que facilitam sua memorização e consequente repetição pelas pessoas. “A popularidade da literatura de cordel ao longo do tempo e a passagem dessa linguagem de geração em geração mostram a importância dos cordéis como meio de comunicação e expressão da cultura brasileira” , diz Lilia. A Cia. Pé do Ouvido compartilha contos de tradição oral e narrativas literárias. A dupla participou do Viagem Literária, gravou contações de história no programa Quintal da Cultura, da TV Cultura, e tem se apresentado em bibliotecas, unidades do Sesc, centros culturais e escolas. Em 2021, montou seu primeiro espetáculo teatral, Os filhos de Iauaretê, a onça-rei, de Kaká Werá, com direção de Thaís Medeiros. A inspiração para o surgimento da companhia veio do movimento crescente de contadoras e contadores de história na cidade de São Paulo, a partir dos anos 2000. A narração de histórias - esta cultura tão antiga quanto a humanidade - estava sendo retomada com muita força naquela época em muitas cidades brasileiras e eu fiquei encantada com a possibilidade de exercer o meu ofício de atriz numa relação mais direta com o público e com as histórias, sem precisar necessariamente do complexo processo de produção coletiva que uma peça teatral exige. Débora Sperl fundou companhia juntamente com Lilia Nemes e permaneceu como parceira até 2023. 
Drika Nunes: aproximando o nordeste e o sudeste brasileiros com brincadeiras, rimas e alegria!

Drika Nunes: aproximando o nordeste e o sudeste brasileiros com brincadeiras, rimas e alegria!

Entre versos, rimas e contações de histórias, Adriana de Fátima Nunes Lima, a Drika Nunes, concluiu sua jornada na 16ª edição Viagem Literária com a sensação de missão cumprida: o de fortalecer os vínculos entre as culturas do nordeste e sudeste do Brasil, trazendo a Literatura de Cordel, tema do programa de 2024, para o centro da programação das bibliotecas públicas das cidades de Presidente Venceslau, Rosana e Narandiba, no interior paulista, entre os dias 20 e 22 de agosto. O público participante da experiência viva das contações de histórias teve o privilégio de se conectar ainda mais com a cultura popular do país, por meio das rimas, das brincadeiras e da alegria, tudo pela voz de Drika. E a comunicóloga, atriz, contadora de histórias e mediadora de leitura, criadora da Cia. Hespérides, deu seu recado logo de cara nas suas apresentações pelo Viagem Literária: “Senta que lá vem história... conhece essa frase? Vamos lá!”“Por que me assistir? Ô da lincença pra quem tá chegando, que agora eu vou contar, tem história daqui e dalí, desde o sertão até a capitar! Eita que vai ter medo, medinho e medão tudo em forma de cordel, bora olhar pras nossas lendas do imaginário de outros tempos, aquelas todas de fazer xixi na cama! Ainda vai ter interação, brincadeiras e histórias surpresas e depois de tudo, tem é o desafio do cordel, quero ver a criançada toda se desafiar, quem vai chegar?”Um pouco mais de Drika Nunes Acredite. A contadora de histórias confessa ter sido muito tímida e insegura no passado. Antes de atuar como professora de literatura viva no projeto Metamorfoses da ONG Casulo e como professora especialista na arte de contar histórias pela Associação Crescer Sempre, ela conta como foi a transição de professora de literatura viva para atriz, contadora de histórias e mediadora de leitura, e como essas experiências anteriores influenciam seu trabalho atual na Cia. Hespérides – que realiza apresentações nacionais e internacionais em teatros, bibliotecas, praças, centros culturais, escolas, livrarias, presídios e hospitais, para públicos de todas as idades.“O teatro chegou antes, nos tempos da universidade. Eu era muito tímida e insegura e o momento de apresentar o TCC para mim era desafiador, então, fui fazer teatro somente com esse intuito e digo que devia ser obrigatório para qualquer pessoa. Foi terapêutico além de tudo, mas.... não optei em seguir”, relembra a contadora. E tudo foi um sucesso: nota 10 no trabalho, que leu rendeu 3 prêmios. Vida que segue. A "contação de histórias" já havia entrado na vida de Drika, quando cursava uma pós-graduação na arte de contar histórias e era professora em uma universidade na Av. Paulista. À época, foi convidada para trabalhar em sala de leitura na comunidade do Paraisópolis. “Meu coração bateu forte, me tirou o sono; A família toda foi contra (naquele momento a comunidade era bem perigosa)”. relembra. Mas ela abraçou a causa, pediu as contas e atravessava a cidade literalmente de norte a sul, todos os dias da semana. Segundo a contadora, o trabalho que mais lhe deu satisfação, amor, alegrias. A partir disso contar histórias se tornou rotina. Aos finais de semana se apresentava em livrarias (todas) Fnac, Cultura, da Vila, Saraiva, Mega Store, em SP, Cotia e Campinas. Contava histórias 7 dias da semana e claro, mediava leitura e criava tempo para os ensaios e criação de repertório para as Hespérides.“Tive a sorte de ter grandes vozes nacionais e internacionais que me direcionaram a descobrir meu lugar no mundo, mas digo que os meus grandes mestres foram: as livrarias, a comunidade e o contar em hospitais; nenhum profissional-artista me ensinou tanto como o fazer; a prática e me influencia até hoje e acredito que para sempre nesse lugar de aprendizado eterno. (ao menos nessa vida). E foi assim, bem assim, que cheguei até aqui”, destacou a atriz. Contando histórias para promover inclusão e transformação socialEm 2023, Drika Nunes tornou-se patrona na Academia Brasileira de Contadores de Histórias. Destacando essa posição na promoção da arte da narrativa oral no Brasil, ela acredita na importância desse papel social de levar as histórias a todos os cantos dentro e fora do país. “Carrego um nome, que é o meu, mas carrego um país quando estou fora, e em cada lugar, levo comigo a ABCH onde me responsabilizo pelas palavras que brotam no mundo, porque são as minhas palavras, mesmo que elas tenham vindo de livros ou de outras bocas, ainda assim, são minhas, comenta.  Vale lembrar que Drika Nunes também eecebeu o Troféu Baobá, considerado o mais importante dos contadores de histórias do Brasil e meembro da Red Internacional de Cuentacuentos.Citando um ditado Etíope "Quando o coração da gente transborda, ele sai pela boca em forma de histórias", Drika diz que toda boa história começa com o silêncio, observação e verdade. “Faz parte do meu trabalho, criar laço ou minimamente conexão e para isso, há que se ter escuta, que é muito mais que ouvir.  "É uma capacidade que nem tod@s tem e, nessa escuta, entrego o meu melhor para aquele momento. De coração a coração!”  Imagem: Drika Nunes em apresentação na cidade de ROsana (Viagem Literária 2024).