Cozinhe o personagem na pressão - Viagem Literária

Cozinhe o personagem na pressão

Wilian Olivato

Capitu, Emília, Sherlock Holmes, Gandalf, Capitão Ahab, João Grilo, Baleia, Alice, Macunaíma, Quixote... Sejam protagonistas ou não, uma boa história é sempre marcada por bons e inesquecíveis personagens. Aquela figura que pode ser humana ou não, boa má ou má, alegre ou depressiva, mas que carrega algo na alma que a faz ser lembrada, ou até odiada, pelos leitores muito tempo depois de ter lido o livro.

 

Criar celebridades literárias não é tarefa fácil. É preciso mergulhar no íntimo de cada personagem para transformar em palavras desde sentimentos, personalidade e relações pessoais até aspectos físicos. Mostrar como funciona esse processo criativo na prática foi o tema da oficina Personagens e seus gestos, ministrada pelo escritor Rafael Gallo, entre 4 e 7 de julho, nas bibliotecas das cidades de Borborema, Bariri, Bocaina e Jaú.

 

Pai de personagens densos e conflituosos, como a Ângela do romance Rebentar, uma mãe a espera do filho desaparecido há três décadas, ou o depressivo Rômulo, do livro Dor Fantasma, um pianista virtuoso que perde a mão em um acidente, Gallo sabe muito bem como transportar para o papel a dor de seus protagonistas. Como técnica, procura colocar seus personagens em situações desconfortáveis e a partir daí descrever seu comportamento em determinada situação. “Isso ajuda muito, cozinhar a personagem na pressão”, diz em entrevista ao site da editora Record.

 

Na oficina, o escritor explicou que pequenos gestos podem demonstrar muito bem aspectos emocionais do personagem. “A técnica está em descrever uma cena sem contar literalmente com as palavras o que ele está sentindo”, ensina. Também é preciso estudo, pesquisa e entrevistas sobre o assunto a ser tratado na obra. “Aspectos da realidade ajudam o leitor a sentir e participar ativamente da história”, observa.

 

Como exemplo de boas produções, Gallo utilizou algumas obras da literatura contemporânea composta por personagens emblemáticos, como Sinfonia em branco, de Adriana Lisboa; Duas tardes, de João Anzanello Carrascoza; Agora agora, de Carlos Eduardo Pereira; A instrução da noite, de Mauricio de Almeida; e Os Malaquias, de Andrea del Fuego.

 

 

O escritor Rafael Gallo recebeu prêmios por todos os seus livros publicados. Sua primeira obra Réveillon e outros dias, ganhou o Prêmio Sesc de Literatura 2012; Rebentar, venceu o Prêmio São Paulo de Literatura 2016; e Dor Fantasma, foi o romance vencedor do Prêmio José Saramago 2022. Tem ainda textos em antologias e coletâneas, incluindo publicações em países como França, Estados Unidos, Cuba, entre outros.

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Fique por dentro de tudo o que acontece nos três módulos do Viagem Literária!

Até breve!

Até breve!

A edição de 2023 do programa Viagem Literária terminou após quatro meses de intensa programação. A caminhada foi longa: mais de 17 mil quilômetros percorridos, passando por 72 bibliotecas de 71 cidades do Estado de São Paulo. Ao todo, foram realizadas 360 ações presenciais e online para um público de cerca de 16 mil pessoas. O ponto alto do projeto foi a participação de 18 grupos/contadores de histórias e 36 escritores, que compartilharam seus talentos e vivências literárias. Neste ano, o programa foi estruturado em três módulos, cada um oferecendo uma experiência única para os participantes. O primeiro abraçou a escrita criativa, com destaque para o ambiente de aprendizagem colaborativo, onde era possível compartilhar ideias, receber feedback dos autores e aprender novas técnicas e estilos. Foram 72 encontros virtuais, com 1.134 participantes, promovidos por um elenco de peso: Bruna Beber, Bruno Ribeiro, Edson Krenak, Flávio Cafieiro, Helo D’Angelo, Ilustralu, Márcio Vassallo, Michel Yakini-Iman, Neide Almeida, Plínio Camillo, Rafael Gallo, Reginaldo Pujol Filho, Roberto Ferreira, Sacolinha, Socorro Acioli, Stephanie Borges, Vanessa Passos e Wlange Keindé. O segundo módulo foi dedicado à contação de histórias, onde os profissionais convidados encantaram a plateia com brincadeiras, música e narrativas envolventes, despertando a imaginação e a paixão pela leitura. Foram 144 apresentações presenciais, dirigidas a mais de 12 mil pessoas, realizadas por um seleto time, composto por Ademir Apparício, Badaiá Arte, Camila Genaro, Cia. Bisclof, Cia. Koi, Cia. Malas Portam, Cia. Mapinguary, Cia. Pé do Ouvido, Cleber Fabiano, Cristino Wapichana, Drika Nunes, Ih, Contei!, Ivani Magalhães, Jô Jorvino, Mandingueiras da Pracinha, Mari Bigio, Sandra Guzmán & Cia. Rabo de Cutia e Tricotando Palavras. O terceiro módulo, Oficinas e Encontros com Escritores, permitiu um contato direto do público com grandes autores, como Aline Valek, André Dahmer, Cláudia Lemes, Estevão Azevedo, Fábio Kabral, Felipe Castilho, Ignácio de Loyola Brandão, Ilan Brenman, Joselia Aguiar, Julie Dorrico, Lúcia Hiratsuka, Luciene Vignoli Müller, Luiza Romão, Michel Yakini-Iman, Monique Malcher, Nina Rizzi, Rita Carelli e Sergio Rodrigues. As aulas e bate-papos presenciais sobre os processos e bastidores da criação literária resultaram em momentos de aproximidade e interação entre os autores e leitores e contaram com a presença de 3.445 pessoas. Ao longo de toda programação, o Viagem Literária celebrou não apenas a literatura brasileira contemporânea, dando luz a obras de vários escritores, mas também fortaleceu a importância das bibliotecas como espaços de encontro, aprendizado e diversidade cultural, deixando como legado a formação de novos leitores e escritores. O Viagem Literária é um programa do Governo do Estado de São Paulo, realizado por meio do SisEB (Sistema Estadual de Bibliotecas Públicas), gerenciado pela SP Leituras – Associação Paulista de Bibliotecas e Leitura. Desde a sua criação em 2008, o programa já percorreu 235 municípios paulistas com mais de 3.600 ações. Contou com a participação de cerca de 300 grupos de contadores de histórias e escritores, e um público de mais de 381 mil pessoas.      
Memórias em cena

Memórias em cena

Fugir do lugar-comum e repensar as cenas do cotidiano com um olhar poético. Essa foi a proposta oficina de escrita criativa “Memórias em cena” da escritora, poeta, educadora e gestora cultural Neide Almeida, para a 16ª edição do programa Viagem Literária. Os encontros virtuais foram realizados de 27 a 30 de novembro, nas bibliotecas das cidades de Jundiaí, Várzea Paulista, Pirapora do Bom Jesus e São Paulo. A primeira atividade da turma foi descrever uma cena vivida ou simplesmente testemunhada. “A partir do conceito ‘escrevivência’, cunhado por Conceição Evaristo, a proposta é registrar por meio da escrita uma cena que tenha afetado os participantes para além de suas vivências individuais”, descreve Neide. O exercício consistia em narrar um acontecimento presenciado pelos participantes, mas com um olhar poético. “Ao usar uma outra lente para enxergar fatos corriqueiros conseguimos ver além do óbvio, isso é o que chamamos de memória poética.” A parte prática do encontro ficou por conta inicialmente da criação de uma legenda para a cena escolhida e posteriormente o desenvolvimento de uma pequena parte de uma história a partir do fragmento escolhido. Como inspiração para o grupo, a autora trouxe trechos de textos de memórias poéticas de autores como Carolina Maria de Jesus, Alberto da Costa e Silva, Zainne Lima da Silva, Ricardo Aleixo e da própria autora.   Neide Almeida é socióloga e especialista em Gestão Cultural e mestra em Linguística. Publicou o livro Nós: 20 poemas e uma Oferenda e tem publicado poemas e crônicas em revistas e antologias. Realiza cursos e eventos pela Fio.de.Contas Produções Culturais.  
Vozes da periferia

Vozes da periferia

O escritor Michel Yakini-Iman levou as vozes e a poesia da periferia de São Paulo para passear pelo interior do estado. Entre os dias 7 de 10 de novembro, o também produtor cultural realizou a oficina virtual “Literatura e oralidade nas periferias de São Paulo” para os públicos das bibliotecas de Limeira, Piracicaba, Santa Bárbara d’Oeste e Itatiba. O objetivo era fazer uma ponte entre a produção de quem escreve na capital com a produção de textos em circulação nas cidades menores. Durante os encontros, Michel apresentou poemas de sua autoria e textos em prosa e poesia de outros escritores. “Também fizemos alguns exercícios de poesia falada e de declamação de textos, exatamente como acontece nos saraus.” O escritor destacou que a evolução da produção literária da periferia de São Paulo vem acontecendo desde o início dos anos 2000 e tem constribuído na formação de novos leitores, no movimento da poesia falada e também no sistema de publicação de selos editoriais. “Esse movimento vem ampliando as vozes e diversificando a literatura brasileira, algo muito importante não apenas para São Paulo, mas para todo o país.” Entre as obras usadas na oficina estão Contos de Yõnu, de Raquel Almeida; Maria Pepe Pueblo/Maria do Povo, de Dinha; Muzimba, na humildade sem maldade, de Akins Kintê; Notas sobre a fome, de Helena Silvestre, entre outros. Michel Yakini-Iman é autor de Futebol não é coisa de menino, Na medula do verbo, Acorde um verso, Crônicas de um peladeiro e do romance Amanhã quero ser vento. Promove palestras e cursos de escrita criativa e é um dos idealizadores do Sarau Elo da Corrente.